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terça-feira, 5 de junho de 2012

AMAPÁ: Uma republiqueta à parte


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Por Cleiton Rodolfo Leite
Sou goiano de nascimento, entretanto moro no Amapá há mais de seis anos. Depois de muita observação em todos os campos - desde o econômico, o cultural e o político - aventuro-me aqui traçar minhas conclusões sobre o que engendra a miséria deste Estado.
O Amapá – assim como os demais ex-territórios da Federação – emancipou-se com a nossa última Constituição, como já deve ser de conhecimento dos ilustres leitores. Entretanto, desde então, não conseguiu ultrapassar sua insignificante participação no PIB nacional, que gira em torno de 0,2%. Ora, já se vão mais de 20 anos de emancipação. O que teria acontecido com os recursos para aqui destinados à época de Território, com a finalidade de desenvolvimento?

"Cheguei à seguinte conclusão: quando aqui era ainda território o que se via era um verdadeiro 'trem da alegria' (...) Criou-se, assim, a famigerada 'economia do contracheque'"

Buscando resposta para a referida pergunta, cheguei à seguinte conclusão: quando aqui era ainda território o que se via era um verdadeiro “trem da alegria”. Governadores nomeados pelo regime militar destinavam recursos provindos do Planalto Central para contratações de correligionários políticos – muitos sem competência alguma, até mesmo semianalfabetos – causando um inchaço na máquina administrativa, mas que não resolvia em nada no que diz respeito ao desenvolvimento econômico, devido até mesmo pela falta de formação adequada da grande maioria desses servidores públicos. Criou-se, assim, a famigerada “economia do contracheque”.
Mas essa conclusão poderia nos conduzir a outra indagação: sim, mas isso se dava quando o Amapá era território. E agora, por que ainda persiste, em pleno ano de 2012, esse “modelo econômico”? Talvez seja porque houve apenas uma mudança no plano político-administrativo, mas não no cultural. Em resumo, o Amapá não se emancipou de fato, mas apenas de direito e continua a se comportar como “o filho caçula completamente dependente dos pais” e que, ao que parece, jamais abandonará as benesses da casa paterna.
Se o restante do país pouco ou nada sabe a respeito do Estado do Amapá, a recíproca é completamente verdadeira. Fazendo uso de números arredondados, posso afirmar sem medo de cometer qualquer injustiça que mais de 70% dos amapaenses jamais saíram dos limites de seu Estado; da outra parcela restante, 20% não passaram de Belém e apenas 10% já estiveram em outras regiões brasileiras. Compõem essa insigne parcela de bem-aventurados, os políticos e a oligarquia amapaense, que nos remete às lembranças da época feudal. Por aqui, as famílias tradicionais têm seus espaços devidamente delineados, seja no controle político, econômico, jurídico ou dos meios de produção (a terra, principalmente).
'Forasteiros'
Ainda falando sobre o plano cultural, para pessoas oriundas de outros Estados, assim como eu, ouvir por parte dos amapaenses que “odeia esse povo que vem de fora roubar nossos empregos” é tão corriqueiro quanto o açaí na mesa do almoço. Isso já se tornou música aos meus ouvidos, mesmo que em princípio me chateasse bastante. Fora um sem número de vezes que tive que repetir, aquilo que acabou tornando-se um chavão: “Eu não roubei emprego de ninguém. Fiz um concurso e passei”. Aquilo que a priori era indignação pessoal acabou se cambiando para uma espécie de piedade, principalmente depois que tomei maior contato com o jeito de ser do povo daqui, como bem diz a letra de uma música de um cantor da terra. Tão preocupados estão em “se dar bem, valendo-se da lei do menor esforço”, abominam tudo aquilo que exige suor para ser conquistado ou àqueles que já compreenderam que numa sociedade capitalista impiedosa e excludente “jacaré parado vira bolsa”. Até mesmo socialistas como nós temos que lutar para sobreviver, valendo-se do capitalismo para poder combatê-lo.
No campo político, tal insignificância persiste. O Amapá é o Estado que possui o menor colégio eleitoral brasileiro. Assim, o Sr. Lula, por

"A Sra. Dilma talvez tenha aparecido ao menos duas vezes: na campanha, para dar uma força para seu aliado político José Sarney e na entrega de alguns apartamentos, cuja construção fora financiada pelo PAC"

exemplo, nos seus oito anos como presidente da República foi mais vezes ao Irã que veio ao Amapá. A Sra. Dilma talvez tenha aparecido ao menos duas vezes: na campanha, para dar uma força para seu aliado político José Sarney e na entrega de alguns apartamentos, cuja construção fora financiada pelo PAC. Aliás, o mencionado senador é adorado por muitos por aqui como uma espécie de semideus, mostrando, desta feita, o quanto o acesso ao conhecimento sobre o país chamado Brasil continua insigne e o quanto o Amapá se encontra isolado do resto da Nação não apenas no campo geográfico, como também no campo do conhecimento histórico: ninguém sabe dizer como foram os anos de presidente do Sr. José Sarney ou sabe de sua história antes de aqui chegar. Segundo narra boa parte até mesmo dos amapaenses mais humildes, a primeira campanha do Sr. José Sarney para o senado, assim que deixou a presidência, foi por videoconferência, ou seja, o candidato sequer se deu ao “trabalho” de vir por aqui para apresentar pessoalmente suas propostas para o Estado. Não obstante e apesar disso, foi eleito.
Sob a batuta do “ilustre senador”, a imensa maioria dos políticos locais age como se aqui fosse uma republiqueta à parte. Não é à toa que este Estado aparece constantemente na mídia como um antro de corrupção. O pior é que não se dão nem ao trabalho de esconder vossos atos ilícitos, inculcando na cabeça do povo que tudo “é normal, pois acontece também no restante do Brasil”. Como a formação da imensa maioria da população é algo que beira a mediocridade, tudo que eles dizem é acatado como dogmas, até mesmo porque boa parte da população se encontra atrelada politicamente a esses “representantes do povo”, na mesma proporção que uma prostituta se encontra dependente de seu cafetão. Desta feita, somos levados a crer que o principal produto de importação do nosso querido Amapá é o óleo de peroba, porque haja cara-de-pau. E quando se começa a criticar tal situação, aparece logo um fulano pra dizer: “se no teu Estado é tão bom, por que não volta pra lá?” Novamente me vejo forçado a exercitar minha piedade.
Q.I.
Afora aqueles que são concursados, nada aqui mais gira que não seja pelo alto Q.I. (quem indicou). Até mesmo na educação – que ainda não conta com gestão democrática- não é difícil nos depararmos com diretores completamente despreparados; aqueles que podemos chamar de analfabetos funcionais. Sobre os professores que se encarregam da formação básica no Estado (1º ao 4ª ano), na sua maioria sequer possui graduação, comprometendo sobremaneira o trabalho de professores, assim como eu, que trabalham com o Ensino Médio e, por efeito cascata, a formação acadêmica.
A falta de perspectiva de vida também é algo gritante. A grande maioria dos alunos com a qual trabalhei nesse tempo só tinha ou só tem como meta terminar o ensino médio. Não é nada difícil encontrá-los trabalhando em pequenas empresas como vendedores, em troca de uma mísera comissão (sem salário fixo), de domingo a domingo e sem registro em carteira - o que é algo muito normal por aqui. Um regime de trabalho semiescravo, onde os direitos historicamente garantidos ao trabalhador são completamente ignorados. Sinceramente, não sei por onde anda ou o que está fazendo a fiscalização do Ministério do Trabalho, no Amapá.

"O Amapá é um Estado que o governo central entregou nas mãos do Sr. José Sarney, como uma espécie de “prêmio”, devido aos seus grandes “préstimos” ao Brasil"

Por fim, diante do exposto cheguei nesses mais de seis anos à seguinte conclusão final: O Amapá é um Estado que o governo central entregou nas mãos do Sr. José Sarney, como uma espécie de “prêmio”, devido aos seus grandes “préstimos” ao Brasil. Como já dissemos anteriormente, uma espécie de um filho caçula, cujos pais não conseguem educá-lo e o entrega às mãos de um tutor, encarregando-se tão somente de cobrir-lhe todas as despesas em troca do prazer de não ter que se responsabilizarem pelo destino do mesmo.
Dinheiro federal é jogado a rodo aqui, mas que não reflete em nada na melhoria de qualidade de vida do povo amapaense, que é um verdadeiro caos para a imensa maioria. Creio que os ilustres leitores, nesse exato momento, estejam fazendo uma comparação com o Estado do Maranhão o que, de forma alguma, seria um equívoco. Quem banca tudo isso? São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Goiás, etc. E pelo que percebo assim será até o dia do tão esperado Juízo Final.
No meu caso específico, vivo em um município chamado Santana, com mais de 100 mil habitantes na zona urbana. O fato de se gabar por ser o segundo município “mais desenvolvido” do Estado destoa completamente com os fatos da realidade: menos de 5% da cidade conta com rede de esgoto; mais de 80% das propriedades não são tituladas, ou seja, por direito ainda pertencem ao poder público, complicando sobremaneira qualquer tentativa de financiamento na CEF para aquisição da casa própria; o lixo produzido ainda possui como endereço a lixeira pública a céu aberto; por aqui, ou se habitua aos urubus e aos ratos que estão a todo tempo pelas portas das casas, ou é melhor que nem venha fundar residência por essas bandas.


Cleiton Rodolfo Leite é professor (concursado), graduado em filosofia pela PUC-GO

ATENÇÃO

A Transparência Amapá vem a público divulgar que o nº798 foi o vencedor da rifa de um IPED 2 32 gb Apple Wi-Fi 3G Branco.
Cabe ainda esclarecer que a Caixa Econômica transferiu os sorteios das sextas para as quartas-feiras. Desta forma, considerou-se o sorteio da quarta mais próxima que foi dia 28/03/2012.
A Amapá Transparência agradece à todos pela colaboração e parabeniza a pessoa sorteada!